Eu tinha acabado de correr os sofridos 10km do "Troféu Cidade de São Paulo", e estava ali no meio da galera no pós-prova, zanzando pra lá e pra cá, tirando umas fotos e tentando encontrar forças pra andar mais outro tantão até onde o carro estava estacionado.
Parei debaixo de uma das muitas árvores frondosas que existem no entorno do Obelisco do Ibirapuera pra aproveitar a sombra e checar o celular, e estava lá distraída postando a foto da minha medalha no Facebook quando um homem me abordou:
"Sem querer incomodar, será que eu posso te dar um depoimento?", ele disse enquanto se aproximava e me olhava de um jeito meio repreensivo, e na mesma hora eu retruquei, meio ríspida: "Já sei, o senhor vai falar que foi roubado por ficar distraído com o celular na mão em algum lugar público, e que eu devia tomar mais cuidado ao invés de ficar parada no meio do Ibirapuera com toda a atenção voltada para o celular, né?"
"Não! Nossa... não, não! Nada disso... eu apenas queria te dar um testemunho de vida mesmo...", ele respondeu, agora num tom tão excessivamente simpático que eu não consegui disfarçar uma bufada e uma torcida no nariz, certa de que ele era na verdade algum evangélico fervoroso que ia tentar me converter.
((não que eu me orgulhe disso, mas quem me conhece sabe que eu sou um poço de antipatia e má vontade quando o assunto é "bater papo com estranhos", sou ZERO receptiva a este tipo de abordagem, gostaria de não ser assim, mas é o ~meu jeitinho~ ogro de ser, desculpa sociedade!))
Eu estava com um dos fones do iPod no ouvido escutando minha playlist "docinho de côco" (AC/DC, Black Sabbath, Iron Maiden, Led Zeppelin e outras cançõezinhas ~leves~ do gênero), e apenas olhei para o homem tentando demonstrar minha total falta de interesse no que quer que ele tivesse pra me dizer, pra ver se ele se tocava e ia embora, mas ele prosseguiu:
"Olha, moça... eu sei que pode parecer estranho, mas você vai entender. Há 3 anos eu tive uma doença muito grave na coluna, precisei fazer várias cirurgias e fui desenganado pelos médicos..." - e se virou pra me mostrar uma cicatriz enorme que começava na nuca e descia pelas costas - ".. mas 3 anos depois de todo aquele terror eu estou aqui, porque por alguma razão que eu também desconheço, a vida achou que eu merecia uma segunda chance.".
E continuou:
"Não vou entrar em detalhes porque não é o caso, mas fato é que tem muita gente que gostaria de ter uma segunda chance de viver e não tem, e eu tive. Eu nasci de novo, e hoje estou aqui, curtindo um estilo de vida saudável, corri, tento me alimentar bem, tento viver da melhor maneira que eu posso, porque eu encaro essa segunda chance como um presente, sabe?"
((neste momento eu tirei o fone do ouvido e realmente comecei a prestar atenção no homem))
"A gente não entende todas as coisas que acontecem na vida, às vezes pessoas boas vão embora antes da hora, às vezes a gente tem que lidar com doenças, com dificuldades, com problemas graves, isso acontece com todo mundo... mas muitas vezes a gente só entende o real significado da vida quando a gente passa por algo como isso que eu passei. E é por isso que hoje eu conto essa história pras pessoas assim aleatoriamente, porque eu acho que as pessoas precisam saber que coisas boas também acontecem, e que sempre vale à pena enxergar a vida como um presente, porque é isso mesmo que ela é, um grande e generoso presente. O jeito que eu encontrei de agradecer ao Universo por esse meu renascimento é esse, é compartilhar minha história com as pessoas para que, quem sabe, sirva pelo menos de inspiração. Me sinto muito abençoado, e não posso guardar essa bênção só pra mim, quero compartilhar com o mundo."
((eu, neste momento, já estava com meio metro de boca aberta e me segurando pra não chorar))
"Era isso que eu queria dizer, moça. Desculpe te interromper aí (e apontou com a cabeça para o celular, ainda na minha mão), espero que não me leve a mal... Tenha um bom dia, e uma ótima vida!". Acenou, sorriu, e foi embora.
E quando ele sumiu da minha vista eu finalmente deixei uma lágrima cair, e voltei pra casa pensando que a vida é mesmo muito surpreendente.
Havia cerca de 10mil pessoas no Obelisco do Ibirapuera nesta manhã de Aniversário de São Paulo. E no meio de tanta gente eu, a pessoa mais cética e antipática do planeta, fui uma das "escolhidas" pra ouvir o tal depoimento daquele homem simples que de fato não queria nada além de contar sua história. Não era um religioso fanático querendo me converter, como eu pensei no começo. Não era um maluco, não era um tarado, não era um inconveniente, não era um ladrão, não era nada além de uma pessoa comum e e coração generoso o bastante para correr o risco de lidar com a hostilidade alheia pelo simples anseio de multiplicar a sua própria bênção.
Não, eu não acho que isso signifique nada especificamente. Mas sem sombra de dúvidas foi muito Inspirador.
E, seguindo a lógica do meu ilustre amigo desconhecido, eis-me aqui multiplicando a história, até porque, no fim das contas, de tudo de tudo eu acho que a vida é isso mesmo: um presente. Um presente que a gente nem sempre usa direito, mas ainda assim um presente, que às vezes só precisa de um pouco de inspiração pra ser melhor aproveitado.
É isso. =)
2 comentários:
Sem palavras.
:)
mUITO BOM O POST !!
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