Vamos supor que dinheiro não fosse problema, e você fosse comprar, sei lá, um carro (*). Qual carro você compraria?
Aposto que assim, de cara, muita gente responderia Ferraris, ou Jaguares, ou BMW´s, ou qualquer outro carrão daqueles que parecem inatingíveis e que a gente só chega perto através das miniaturas do Hot Wheels ou do lado de lá da cordinha no Salão do Automóvel.
Todo mundo sonha (ou já sonhou) com um carrão super potente, imponente, bonito, performático, que diz a que veio no primeiro ronco do motor, que faz inveja a qualquer um e povoa o imaginário de todos os outros.
Mas acontece que esta não é uma compra simples. Adquirir um destes carrões implica bancá-lo. E não estou me referindo a valores monetários.
Porque é assim: Um carrão destes, objetificado, não passa desapercebido por aí. Onde quer que vá, haverá sempre alguém para cobiçá-lo. Onde quer que vá, será sempre visado, potencializando os riscos, por exemplo, de ser roubado. Um carrão deste porte requer cuidados específicos, manutenção adequada, combustível de primeira linha, enfim... um carrão destes DÁ TRABALHO. E fazendo esta rápida análise, chega a parecer um mau negócio.
Por outro lado, se você se propuser a bancar todas estas peculiaridades do carrão, se você se propuser a fazer um esforço para se moldar a um carro diferente dos convencionais aos quais você está acostumado, se você se propuser a seguir seus instintos e sair do lugar comum, e aprender a lidar com algo aparentemente novo (mas que no fundo é apenas um carro, com alguma ousadia), vai ganhar a grande recompensa reservada a pouquíssimos corajosos que bancam a escolha, e sentir o verdadeiro prazer que só um carrão pode proporcionar.
Não que os carros de menor porte não façam as mesmas coisas, eles fazem! Dependendo do ponto de vista, fazem a mesma coisa até melhor e por um preço menor. Dependendo do ponto de vista, são mais vantajosos, seguros e estáveis. E podem parecer um bom negócio. E talvez efetivamente o sejam.
E é por isso mesmo que é tudo uma questão de gosto e de escolha.
Há quem escolha o prazer de guiar uma super máquina e desfrutar de conforto e prazer cotidianos, em troca de alguma insegurança inicial e necessidade de adaptação à novidade;
E há quem escolha a segurança de guiar um carro comum e desfrutar de conforto e prazer cotidianos, em troca de nenhum esforço, porque é ao que já se está acostumado. Mais fácil, né?
E é aí que o assunto vira questão também de coragem.
Quando as pessoas escolhem o utilitário comum porque isso as satisfaz, está tudo ótimo. Mas o que a gente acaba vendo muito é gente que escolhe o utilitário comum porque não teve CORAGEM de bancar o carrão, porque não teve CORAGEM de bancar os riscos envolvidos, e vai passar o resto do tempo sufocando aquele desejo que podia ter sido saciado - a grana estava toda ali, na mão - simplesmente porque não deu conta de BANCAR uma escolha mais ousada.
Eu não consigo entender. Ou melhor, entender eu entendo, acabei de teorizar a coisa toda aí acima, mas eu não consigo, sei lá, respeitar esse tipo de escolha covarde.
Eu não consigo respeitar gente que QUER um carrão, que SONHA com um carrão, que DESEJA um carrão, que dirige todos os dias seu carrinho comum IMAGINANDO como seria bom dirigir todos os dias um carrão e então, quando consegue a grana pra comprá-lo e ele está ali à sua frente, reluzindo, declina justamente por ele ser... um carrão! Coisa de gente fraca, que sequer consegue bancar os próprios desejos.
Mas, afinal, a vida é mesmo assim, e algumas conquistas serão eternamente reservadas SÓ PARA OS FORTES!
(*) Eu e minhas analogias automobilísticas bobas, perdoem-me por isso! Mas é que reli hoje o texto Tadinha da Ferrari e me ocorreu que automóveis servem pra ilustrar muitas coisas nesse terreno aí...(**) A Ferrari do outro texto / o Carrão deste de hoje não é megalomaníaca nem se acha melhor do que ninguém, muito pelo contrário. Ela apenas tem noção da sua condição, e está bem cansada de pessoas que demonstram desejos infinitos por ela sem contudo terem coragem de bancá-la, tentando mantê-la sempre em algum lugar entre a realidade e o imaginário, sem pegar nem largar. Tivesse nascido Fusca, sua vida certamente seria menos frustrante
2 comentários:
Magnífico texto.
Só tenho pena de te informar que quem nasceu pra ferrari, não será fusca nunca mais...
Mais uma analogia interessantíssima... é isso mesmo, a vida é para os fortes e mais nada...
bjos
Perfeito, prima!
É exatamente o que penso e você foi muito feliz na escolha das palavras. Uma lição para todos.
Parabéns!
Postar um comentário