Dando início à Retrospectiva de Aniversário do Blog, segue uma das primeiras histórias surreais e engraçadas que eu adorei escrever.Neste caso, porém, embora exista um breve preâmbulo sobre como eu me tornei uma pessoa que cai, o foco foi minha amiga Carrie-Ann Borgshaw, cuja identidade foi preservada em troca dessa alusão à personagem Carrie Bradshaw, do seriado Sex and the City.(Texto publicado originalmente em 11/05/07.)
São Paulo é uma Metrópole perigosa... isso todo mundo já sabe...
Mas, preciso alertar... O perigo está em toda parte, até nos locais mais improváveis...
O Metrô, por exemplo... O Metrô de São Paulo é um dos grandes orgulhos da população... É eficiente (na maior parte do tempo), é seguro, é rápido, é limpo, é organizado... Mas pode significar um perigo para a integridade dos que por ali circulam...
Eu mesma, já fui vítima do Metrô... Isso foi há bastante tempo, é verdade, talvez uns 12 ou 13 anos, quando eu ainda estava começando a Faculdade... Tempos difíceis, eu não tinha carro, morava e trabalhava longe, e agradecia todos os dias por existir o Metrô, o único transporte capaz de me levar rapidamente do local de trabalho pra Faculdade, da Faculdade pra casa, etc... Era corrido, eu saía do trabalho ali na região da Paulista às 18h30 e tinha que estar às 19h00 na Liberdade, então corria para a estação do Metrô, fazia baldeação na estação Paraíso e quase sempre conseguia chegar à tempo na FMU... Muito estudiosa que sempre fui, vivia carregada de livros e cadernos, estava sempre com os braços ocupados dos pesados livros de Direito...
Pois bem. Eis que um belo dia eu, atrasada como sempre, enfrentei aquela loucura que é o embarque na estação Paraíso. Ali, costuma acontecer quase um fenômeno da física, pois mesmo que você esteja parado, quando as portas do trem se abrem você é empurrado pra dentro do trem, nem precisa se mexer... a multidão que vem atrás se encarrega de te levar naquele comboio humano para dentro da lata de sardinha, ops! do trem! E neste fatídico dia eu, sendo empurrada pela multidão, abraçada aos meus preciosos livros e à minha bolsa, de repente me vi descendo para o nível inferior ao das demais pessoas... trocando em miúdos, eu caí no vão que existe entre a plataforma e o trem, simplesmente caí, mas não completamente porque a certa altura eu "entalei"...
Quando as pessoas perceberam, foi aquele auê, todo mundo gritando para que o trem não partisse, pedindo socorro, apareciam mãos de todos os lados tentando me puxar, e eu só conseguia ficar estática, não olhava pra cima, nem pra baixo, nem para os lados, de tanta vergonha que sentia... foi patético, lógico... mas um guindaste humano formado por quase todos que estavam na plataforma finalmente conseguiu me "desentalar", e eu queria sair andando, como se nada tivesse acontecido... minha perna toda machucada, e eu de cabeça baixa dizendo "tá tudo bem, tá tudo bem"...
O resumo do "mico" foi que tive que ser transportada de cadeira de rodas pela equipe do metrô até o lado de fora da Estação, onde uma viatura já aguardava para me levar ao Hospital... Não houve nada grave, tive que tomar vacina anti-tetânica por ter me machucado na estrutura de ferro do trem, fizeram um curativo no machucado e eu sobrevivi... E, passada toda a vergonha da situação, essa história virou uma das melhores piadas sobre a minha vida entre os meus amigos mais próximos, para os quais caí na besteira de contar o ocorrido...
Mas ok, eu também achava engraçado, e era mesmo... e a verdade é que mais cedo ou mais tarde eu acabaria mesmo caindo no metrô, porque eu sou, como diz uma grande amiga minha, "uma pessoa que cai"... tenho problema de equilíbrio, sempre foi assim, e já caí nos lugares públicos mais inimagináveis, até grávida de 7 meses eu caí... já senti muita vergonha, mas acabei desenvolvendo uma técnica comportamental para esse tipo de situação, então hoje em dia eu tiro de letra...
Agora, o que ninguém nunca espera é que uma pessoa fina e elegante sofra uma situação assim, publicamente constrangedora...
Tenho uma amiga, na verdade a amiga de uma grande amiga que acabou também virando amiga, que é de uma elegância incontestável. Carrie-Ann Borgshaw é única... Desfila elegantemente pela cidade sempre num muito bem cortado terninho Chanell, mantendo a elegante postura nos altos saltos dos chiquérrimos sapatos Manolo Blanik... Não há quem não note tanta elegância... E como uma pessoa fina e elegante que é, utiliza o Metrô como meio de transporte entre um compromisso e outro, pois ela é politicamente correta e procura contribuir para a diminuição do trânsito e da poluição na cidade, deixando seu carro importado na garagem do suntuoso prédio onde mora...
Mas... como eu disse no começo... São Paulo é um perigo... e o Metrô é praticamente um lobo em pele de cordeiro!!!
Eis que ontem, no final da tarde, Carrie-Ann Borgshaw deslocava-se entre um compromisso e outro, sempre apressada e concentrada, e mais uma vez estava na Plataforma de uma certa Estação do Metrô aguardando o próximo trem... Gente elegante não se importa em usar transporte público, eu já disse isso, né??? Então, como sempre, Carrie-Ann Borgshaw estava impecável, cabelo muito bem escovado, roupa de primeira linha, e os belíssimos Manolo Blanik recém comprados em seus privilegiados pés... Mas...
Chega o trem. Carrie-Ann dirige-se para o seu interior, levemente empurrada pelo povão mal-educado que vinha atrás, e o impossível acontece! Não, Carrie-Ann Borshaw não caiu no vão entre o trem e a plataforma, ela jamais cairia, ela, ao contrário de mim, é uma "pessoa que não cai"... Mas o Manolo, ahhhhh... algum infeliz atrás de Carrie pisou em seu calcanhar, e o Manolo, um sapato que jamais apertaria o pé de alguém, simplesmete escorregou vão abaixo...
Sim!!! Carrie-Ann Borgshaw perdeu seu Manolo Blanik novinho, no vão do Metrô!!!
A cena que se seguiu foi horrível... Carrie-Ann tentando desesperadamente sair de dentro do trem para recuperar o salto, o sapato e, consequentemente a elegância, enquanto aquela multidão que não faz a menor idéia do valor de um Manolo vinha na contra-mão, empurrando-a de volta para o interior do trem...
Desesperada com a possibilidade de perder para sempre seu seu precioso calçado, Carrie-Ann, movida de uma fúria momentânea e repentina, conseguiu livrar-se daquele bando de pobres na contra-mão e saiu do trem desesperada, com medo que as engrenagens do metrô atropelassem seu sapatinho... Gritou, esperneou, chamou um funcionário, até que apareceu uma mulher da equipe de segurança (pobre, é lógico) e lhe perguntou: "Ah, mas esse sapato é assim, tão importante??? Você não pode deixá-lo lá???"
Carrie-Ann Borgshaw sentiu vontade de tirar o outro pé do sapato e enfiar o salto agulha na testa daquela mulher... O que acabara de dizer era uma heresia!!! Ninguém largaria um Manolo no vão do metrô, em lugar nenhum do mundo!!! Mas até para perder a elegância nessa vida há um limite, e Carrie-Ann já tinha dado sua cota de contribuição para o mundo do "barraco" naquele dia, então respirou fundo, refez a postura mantendo o pé descalço em ponta, olhou fundo nos olhos da funcionária e disse apenas, em tom suave, mas severo: "Por favor, preciso do meu sapato... agora!!! Nenhum trem partirá enquanto ele não for resgatado".
Compreendendo a gravidade da situação, a funcionária finalmente acionou a equipe de resgate que, após interditar as linhas do Metrô por cerca de 40 minutos, conseguiu retirar o Manolo dos trilhos, ainda intacto, apesar de um leve arranhãozinho aqui e ali... Para Carrie-Ann Borgshaw foi quase como nascer de novo... A vontade que tinha naquele momento era de acariciar seu sapato e de beijá-lo, mas deixou para fazer isso num momento mais íntimo, e apenas calçou seu sapato, recompôs-se, gentilmente agradeceu aos 36 funcionários do Resgate envolvidos na operação e retirou-se da Plataforma...
Carrie-Ann Borgshaw e os Manolo Blanik passam bem, mas serão a piada mais engraçada da turma de amigos por um bom tempo...
2 comentários:
É verdade esta estória desta tal "Carrie sei lá das constas"?
Quem é esta pessoa que faz o metrô parar por quarenta minutos?
Se ela fizer parte do nosso círculo de amigos preciso conhece-la, pois ela teve ter um olhar destruidor de pobres.
Tudo bem, bem legal este post, mais uma vez vc consegui nos colocar visualizando a estória, que deve ter sido tragicômica.
Te Amo.
só quem tem sabe um valor (sentimental/financeiro) de um manolo!
ele não poderia ficar lá para ser estragado e destruído pelo trem... nunca!
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